quarta-feira, agosto 30, 2006

Palavras do Rei



Não se perca
nas curvas da estrada de Santos
nem debaixo dos caracóis de meus cabelos:
palavras do Rei.

não se perca
entre as lutas fictícias entre o bem e o mal
certo e errado
qualidades e defeitos
luzes e sombras
branco e preto
jovem e velho
eu e você:
palavras das luzes urbanas.

sexta-feira, agosto 25, 2006

Amor-capacho

Reorganizei meus pelos
Lavei-os com amaciante de roupas
Só para ser um piso macio
Para tuas sandálias
E teu salto alto.
Que deixem marcas profundas
Quando sapatearem sobre mim
Aquele jazz de New Orleans
Ressurgida de sua katrina
Com a dor dos furacões enraivecidos
Chorando as perdas de seus violões
E cantos roucos das ruas.
Mas tua dança
Sobre o amor-capacho
Não será de raiva,
Nem de vingança,
Será de esperança.
Estando em baixo
(por baixo nunca estou)
Vejo as curvas dos tornozelos
Sob um fundo azul
Vejo as estrelas e a lua
Se noite for.


segunda-feira, agosto 21, 2006

Razão e felicidade


Não quero ter sempre razão
Gostaria de sempre ser feliz.
Tenho sucesso nas duas proposições:
quase nunca tenho razão
por desacertos de minha inteligência
ou acertos de minha ignorância
(reivindico meu sagrado direito à ignorância)
e sou feliz por opção.
E bem-humorado por obrigação
e respeito ao outro.


domingo, agosto 20, 2006

INDIVÍDUO



Não sou liberal
não sou conservador.
Eu sou UM
INDIVÍDUO.

Não pertenço a tribos
nem a escolas
não escondo em trincheiras
não habito em guetos
não frequento igrejas.
Não caibo em panelas
embora seja sempre fritado.

Meu mundo cabe em minha mochila
onde tem um livro
um canivete
(todo homem devia ter um canivete
símbolo fálico poderoso
que trazemos desde a infância
vivida no interior)
uma chave de fenda
uma caneta
um caderno de anotações
(poesia não avisa quando vem)
um par de óculos
(presente do portal do tempo)
uma agenda
(sou homem de compromissos)
e muitas lembranças.

Não sou politicamente correto
sou a favor de cotas
odeio patrulhas
não filio a partidos
voto sempre nos contrários

à elitização nacional.

Não sou branco
não sou negro
não sou índio.
Sou pardo
sou mestiço
aquele que não parece nada
por ser mistura de tudo.

Preciso aprender sempre
para me desvencilhar de rótulos
das amarras
e ter pensamento livre.

Não sei rezar nem orar:
sou animista.

Meus animais de estimação:
uma onça pintada -
encontro-a regularmente,
ensinou-me sutilezas
de observação e convivência;
uma casal de saíras -
visitantes de meu jardim
cagantes em minha janela;
uma família de calangos -
predadores de insetos
de meu quintal.

Não me apego a objetos
não consigo carregá-los
em viagens e mudanças:
não moro três anos no mesmo endereço.

Não sei dar nó em gravata
evito cair em armadilhas
reais ou intelectuais.

AMO AS MULHERES!

OBJETOS I



Caos
se transforma em coisa
que se transforma em objeto.
Objeto em princípio é útil
depois torna-se inutilidade
quem sabe chega a arte.
Como arte se intala
até perder-se no caos.
Num futuro arqueológico
será arte de novo.
Para sempre, quem sabe?

sábado, agosto 19, 2006

Homens, fracassos e arte


Ao homem só resta a Arte.
Não existe harmonia
nem paz na natureza.
Luta pela sobrevivência é violenta
em qualquer planeta.
Flores explodem para nascer.
Arte também é violenta
ou se violenta.
Natureza romântica
é fantasia humana.
Criar jararacas e cascavéis
lucra mais que plantar soja:
e matamos nossas serpentes
como se encarnassem nossos diabos.
Mas os diabos são os outros
como são outros nossos fracassos.
Arte é sinopse e redenção dos fracassos.

paradoxos e incertezas


Pensamentos estreitos
não cansem vossas belezas
nem a minha.
Não tenho receita para corrigir rotinas
reescrever cotidianos
nem refazer frases mal elaboradas.
Minha cabeça vai bem obrigado.
Único problema ml resolvido
é que ela pensa de um jeito
eu faço diferente
só para contrariar meus pensamentos
testar meus paradoxos
explorar minhas incertezas
e ouvir frase de alguém:
- Eu não te entendo
mas te acho engraçado:
você me tranquiliza
e gasta seu tempo comigo -
Saiba meu bem!
Você é mais preciosa que meu tempo.


terça-feira, agosto 15, 2006

Simples



Questões filosóficas da modernidade
Mantém bases platonianas:
melhorar a rotina
manter-se belo e saudável
ter dinheiro para pagar as contas
tratar a vida com ética
cuidar de si e de alguém próximo
manter ganância do tamanho da fome
preparar o futuro no limite da esperança.

Tudo com toque de singularidade
Para não perder traços autorais
Dos atores das cenas cotidianas.


segunda-feira, agosto 14, 2006

(de novo)



Enquanto escrevemos em cima de um nada
tudo re-acontece no espaço vago em torno de mim:
meu time perdeu
(de novo)
minha mulher viajou
(de novo)
meu coração disparou
(de novo)
me encantei com os olhos da poeta
(de novo)
minha mãe me sorriu
(de novo)
minha filha me beijou
(de novo)
meus olhos merejaram ao ver meu pai feliz
(de novo)
sonhei com a deusa de trás da serra
(de novo)
a rola-moça pegou fogo
(de novo)
teus poemas me deixam em efervescência
(de novo)
versos despontam como pedras
atiradas pelos não pecadores
(de novo).
Mas confesso - não consigo parar de pensar
que eu possa encher os vácuos da vida
com estas frases ligadas
estas conversas amarradas
como redes de pescador
em busca de uma bela anchova
ou (quem sabe?) de uma sereia.
Se eu não fosse Ulisses
me perderia nessa Odisséia.


domingo, agosto 13, 2006

Sedução do nada



Não é o tudo que me seduz
O que me seduz é o nada
As saliências e as entrelinhas
O oco e o vazio.
Buracos me enchem os olhos
Terreno baldio brilha
Crateras parecem-me lindas
Abismo é encantador
Núcleo dos átomos
É uma ilhota
Em oceano de vácuo.
Espaços desocupados
Ausências e silêncios
Ícones de sedução
e da controvérsia:
Preenchê-los com a beleza
que eu queira
ou admirá-los
em desmatéria sólida?

sexta-feira, agosto 11, 2006

Lua em Peixes


Amor em baixa!
Mas com Lua em Peixes
Eu não me importo.
Irei nadando pelo éter
Até nosso pequeno astro.



quarta-feira, agosto 09, 2006

Pensamento migrante



Meu tempo parte num momento sólido
aquele onde o peso das horas entorta os ponteiros.
Sonhos sugados pelo buraco negro
permanecem vivos em mundos paralelos
em cabeças de nossos contrários perfeitos.
Gostaria de encontrar meu contrário perfeito.
Talvez nos anulássemos como matéria e antimatéria
E nos tornaríamos nada?
Não gostei de meu pensamento
mas não consigo controlá-lo,
ele voa mais que albatroz migrante entre brasil e áfrica.

Bocas queimadas

Quantas rupturas preparamos?
Quantos desastres previmos no ano anterior?
Um sem-número de separações litigiosas?
Arrancar a boca que eu beijei e jogá-la aos leões?
Eu moldei essa boca em barro,
queimei no forno e pintei.
Quero, na verdade, guardá-la mais um pouco.
Semana próxima eu a partirei em mil pedaços.
Contente?

Chuvas de metano


Chuva de metano em Titã
Lua de Saturno.
Quando Saturno passar por Peixes
deixará suas chuvas tóxicas
em meu universo de pedras
e jardim de cactos?

Que fronteiras entre ciência e ficção?
Arte precipita-me
com leituras tecnológicas, claro!
Meu desejo é expandir fronteiras
experimentar novas maneiras
mudar cenários com inspiração
escrever minhas letras com transpiração.

terça-feira, agosto 08, 2006

Minhas conjunções



Pontos e vírgulas, reticências...
Reminicências de uma oração sem sujeito
nem sujeito oculto.
Sombras de uma letra bordada
no coração do poeta
com agulha de crochê.
Aquele verbo mal dito
em hora imprópria
calou minhas orações subordinadas.
Restam-me conjunções.
Não sei o que faço com elas:
se as como com sal e pimenta
se amo-as desenfreadamente.


sexta-feira, agosto 04, 2006

Renascer tuas vírgulas


Irei catar teus cacos
reescrever teus rótulos
beber teu coquetel de asteriscos
sem diminuir teus arte-riscos
nem tua dose de verdade
remonto tua pele
e desenho nela
o nome de teu amado
com letra de bordado
cheio de pudores
pleno de pretextos
para renascer tuas vírgulas.


Olhos de águia



Vênus me oferece olhos de águia
para enxergar longe
ver se o caminho está livre.

Eu só quero ver o pôr do sol
E aquela boca em cerâmica
modelada por mim
Ontem depois do jantar.

Mambembes planos



Mambembes planos
de mudar de vida:
derreto-me no cenário.
Papo despretencioso na ribalta
escondem raras oportunidades .
Tento pescá-las
aperfeceiçoar compromissos
raros e espalhados.
Ainda quero amar mil mulheres.


Séculos vazios


O cair das máscaras embaralha
identidades e predestinações.
Em pleno século vinte e um
tiramos caixas dentro de caixas
na última caixa não tem um anel,
ela está vazia.
Século dos vazios?
Silêncio de conteúdos?
Aquela música sertaneja (sic)
no último ponto do dial de volume
de meu anônimo vizinho
obriga-me a tapar as orelhas.
Os loucos estão cada vez mais próximos
estranhamente próximos.
O mundo transborda destes bardos
desrespeitosos e maléficos.
Precisamos de novos destinos.