sábado, dezembro 18, 2010

CURTA Nº 15



Sonhar contigo
tempo antigo
cabeleiras e cetins.
Fotos desbotadas
tardes amareladas
colinas e marfins.


CURTA Nº 14 (NA RUA)




Ella
nua
crua
negra
pura
dura
invade-me.

E explode
a rua.

CURTAS Nº 13 (mel)



Comprei um pote de mel
de flores silvestres.
Provei-o com o dedo.
Lembrei-me de uma boca
tive saudades de um beijo.
Senti, na língua, a doçura de um corpo.

quarta-feira, dezembro 15, 2010

PALAVRAS E SILÊNCIO



Palavras, algumas,
precisam ser gritadas
para existirem,
depois dicionarizadas.


Palavras, outras,
melhor sussuradas,
seja ao vento
e longe encaminhadas,
seja às orelhas
de uma amada.


Palavras, umas,
preferem ruídos e chiados
em ressonância transmitidas.


Palavras, comuns,
soam normalmente suaves
por pessoas visivelmente calmas,
sem grandes apelos dos sentidos.


Mas o silêncio, este,
só entendido por outro silêncio.
Aquele de dentro,
cultivado por poucos
nada normais medianos.
Às vezes lúcidos.


Quem ama o silêncio
é capaz de amar um mundo.
Até mesmo outra pessoa.

sexta-feira, novembro 19, 2010

RELEITURAS ROSEANAS 12





Do engano, fabrica-se acertos.
O erro, certifica-se em cartório:
falseia-se e averdadeira-se,
faz-se de contas que foi tragédia.
Ajustada nas batentes jornadas
comedia-se, renovada história.
O antes torto, retifica-se
o excêntrico, circunferencia-se.
Tudo se acerta na vida
apesar de árduas trajetórias:
deuses e demônios são transitórios.

CURTA N° 12



Em minha cama
bem como na lama
deito e rolo.
Adoro pérolas.

quinta-feira, outubro 07, 2010

ALGUMAS COISAS



Algumas músicas devem ser apreciadas
Em noites de tempestade:
Dançá-las requer sintonia com os uivos de vento.

Alguns livros devem ser lidos
Ao claro sol de inverno:
Aquecem a alma mais que o dia.

Alguns vinhos só podem ser bebidos
Em boa companhia:
Bebe-se simultaneamente
O vinho e a companhia.

Alguns filmes precisam de solidão
Para serem entendidos:
Uma solidão a dois às vezes é permitida.

Algumas conversas precisam de público
Para serem espalhadas:
De cabeça em cabeça falas se entornam.

Algumas palavras que quero dizer
Precisam que teus ouvidos as escutem
E lhas dem um significado
Que apenas tu entenderias.





MEUS DIAS SÃO QUASE

Meus dias são quase todos mais de meio dia
plenos de ocasos e por do sol.
São anoiteceres calmos
mesmo se tempestade se anuncia.
Daí vem plena satisfação minha
de espiar os amanheceres
as mornas manhãs empassaradas
de plenos cantares
e aquelas luzes coloridas pálidas
próprias das auroras
semelhantes a olhares de moças encantadas
a nos cismarem com mixto de medo e vontades.

Meus dias são quase todos tardes
com certa preguiça depositada
nos andamentos das tarefas cumpridas
embora à busca de novas lutas
enquanto o claro-escuro de estrelas chegando
ainda nos alcanse com algumas virtudes.

Meus dias são quase noite.

terça-feira, setembro 21, 2010

MANUAL SOBRE COMO CRIAR TORNADOS




1.   1. Abra espaços para pensamentos incertos e ações inesperadas: quanto mais inesperados e imprevisíveis melhor;
2.   2. É preciso parar o tempo: tornados só aparecem depois de calmarias, naqueles momentos em que se esquece o instante anterior desacontecido;
3.   3. Não veja televisão se deseja criar tornados, esses não acontecem quando você está paralisado assistindo aqueles programas tediosos da TV (a maioria);
4.   4. Estimule o frio na barriga, esse é um ótimo indicador de possibilidades de surgimento de novos tornados;
5.   5. Se for do sexo feminino caminhe de salto bem alto e roupas provocantes: assobios (e bater de asas de borboletas) provocam tornados em algum lugar do planeta, segundo a teoria do caos;
6.   6. Se for do sexo masculino, assobie quando vir uma mulher de salto alto e roupas provocantes com ar descontraído e feliz caminhando na rua: se ela estiver acompanhada assobie assim mesmo;
7.   7. Seja incondicionalmente feliz: a felicidade provoca alterações orgânicas em algumas pessoas de nossa vizinhança, alterações essas que aumentam a probabilidade de surgimento de tornados exatamente por serem imprevisíveis (seja feliz por querer);
8.   8. Ponha "um gosto de amor na tua boca, nas tuas mãos... Aquela tempestade boa (aparece) dentro de ti" (Bel Gurgel – http://acrisedosquarenta.blogspot.com).


domingo, agosto 29, 2010

FUTEBOL ARTE





Emoções do futebol-arte
como arte de grandes mestres
da pintura teatro cinema música literatura
e outras artes.
Jogadas dignas de Fernanda Montenegro
Marieta Severo ou Sérgio Brito,
Machado, Rosa ou Drumond,
Pixinguinha, Villa Lobos ou Cartola.
Toques de bola de Cacá Diegues
ou Nelson Pereira dos Santos.
Craques são poucos, diz o craque Tostão.
E quando o craque para, pensa e decide
é gol. Lindo como todas as obras primas!
Ri e chorei em jogada de time
para o qual nem torço!
Torço pela arte.

sábado, agosto 14, 2010

VALE A PENA VIVER 11

Penso, logo o acaso existe.
A existência do acaso
Transforma-nos em filósofos.
O destino nos conduziria em suas amarras
E não nos permitiria
Tempos e espaços para abstrações.
Reminiscências do passado são boas,
Projetos e sonhos para o futuro são necessários
Mas viver o presente
Como um sorvete derretendo em nossa boca
É melhor ainda e mais importante.
O acaso nos coloca em esquinas variáveis,
Deixa-nos a livre escolha de caminhos.
Sejamos aptos para as opções possíveis
Pois vale a pena viver
Ao sabor dos acasos e do livre pensar.



segunda-feira, agosto 09, 2010

VALE A PENA VIVER 10



Minhas musas as conheci jovens:
Katherine Ross
em "Onde os homens são mais homens";
Marília Pera
em "Anjos da Noite";
Gal Costa
cantando Flor do Cerrado
e Trem das Onze;
e muitas outras.
Quando penso em minhas antigas musas
não penso no tempo
e seu carater depredador de nossas imagens:
musas não envelhecem em nossas memórias
que o tempo dilacera em menor velocidade.
Elas mesclam-se, em nosso pensamento,
com outras musas, mais jovens,
conhecidas durante o caminho
e por quem igualmente nos apaixonamos.
Brindemos nossas musas, Cecéu,
pela eternidade delas através de nosso testemunho.
Viver nelas
(como escreveu Yoko Ono)
é uma dádiva e uma necessidade.

domingo, agosto 08, 2010

CURTA Nº 11

Sou um pai muito amado
pelos filhos dos outros.
Os meus tratam-me com indiferença.
Trajetórias.
Difícill refazer caminhos
quando se deixa ervas daninhas
lianas e jararacas
reocuparem as trilhas.

quinta-feira, julho 15, 2010

CURTA NÚMERO 10



É sempre possível fazer poesia
mesmo com pétalas falsas
e pedras de bijuterias.

quarta-feira, julho 14, 2010

CURTA NÚMERO 09


Nada que eu escrevo
é sobre mim mesmo,
é sobre meu outro eu.
Tudo que eu escrevo
é outrobiográfico.

quinta-feira, junho 24, 2010

FUTEBOL É POESIA

Por décimos de segundo a bola se esconde.
Vigiada de todos os lados:
32 olhos eletrônicos a observam
mapeiam
redesenham sua trajetória
fiscalizam suas puras curvas
conceituam seus humores
assertivam suas negativas
postulam suas imposturáveis regras.

Mas a bola, vingando-se de seus criadores
dos laboratórios das genéticas tecnológicas
dos materias insofismáveis,
deixou cegos e atônitos
milhões de espectadores.
Onde esteve nesse imensurável décimo de segundo?
Na linha do gol
ou em suas entrelinhas?

domingo, junho 20, 2010

VALE A PENA VIVER 09



Mais de quarenta anos de futebol
Essas pernas correram
Como se corre atrás de sonhos
Como se corre atrás de pequenas ilusões,
Ou grandes, não importa.
Não fui craque da peleja ludopédica
Apenas um atrevido peladeiro
Dos clubes factoriais e de companheiros,
Fanáticos como eu, talvez.
Pedalei o suficiente para lembrar
Da insustentável leveza da redonda
Amortecida no peito,
Descendo em câmara lenta pelas pernas
Até chegar, mansa e macia, nos pés
Que tentavam sempre a grande jogada:
Talvez não viesse, tal grande jogada,
Talvez a perdesse para um adversário
Qualquer coisa na sequência
era uma grande jogada
e, honestamente, viveria de novo:
reivindico a marcha-ré de Chronos,
o movimento no sentido anti-horário,
o retorno, que breve seja,
a um instante fugaz de alguns anos atrás
para, de novo, sentir essa alegria ínfima,
porém majestosa, de correr depois do gol.

quinta-feira, maio 20, 2010

EM TEMPOS DE COPA




Mais velho queria ser
Para dizer aos netos que ainda virão:
Meninos eu vi.
Eu vi Nilton Santos,
O Enciclopédia do Futebol,
Jogar na esquerda lateral dos gramados da vida.
Infelizmente, isso aconteceu apenas nos memoriais
Televisivos e nos imaginários dos peladeiros oficiais
Como eu: quarenta anos de pelada,
Canelando naquela canhota faixa dos campos.

Claro, eu ouvi o Nilton Santos jogar
No grande rádio a válvula,
Construído por meu pai
Em curso de eletrônica por correspondência,
E postado no canto nobre da sala de visita
Da casa de minha infância
Na entrada da Mata do Jambreiro.
Tentava fazer no campo de várzea
A quinhentos metros de casa
Nas peladas depois das quatro da tarde
As geniais jogadas do mestre.
Triste ilusão: meus chutes de trivela
Só aconteceram em meu coração
E ainda carrego como sina de torcedor
A estrela solitária do Botafogo:
Tornei-me, precocemente, sofredor.

domingo, maio 09, 2010

Eu, o irresponsável






Certo dia, beirando cinqüenta,
Encontrou-me  antigo colega
Adentrando-me na paisagem urbana
Meio à preguiça de plantar-me no parque
Desencorajado de cheirar imobilidades
E ler a língua de sinais dos pássaros mudos.
Você não envelhece, meu caro,
 – disse-me –
também pudera: sempre foi irresponsável!
Claro – respondi –
Assumi a irresponsabilidade de meus atos
Antes mesmo de responder absurdos
E demolir conjecturas.


CURTA NÚMERO 08





Palavras são sujas:


quando se poemam


clarificam-se


Pedras, dores e poeiras do caminho


iluminam-se


ao arredondamento das frases.


É a força da Poética.



VALE A PENA VIVER Nº 08





O mundo cresce com as metáforas dos poetas
É o barro do chão quem afirma:
Pedra maldita no meio do caminho
Não machuca, transforma-se em palavra
O gorjeio dos pássaros inunda arvoredos
A luz da manhã desbota paredes
Vênus amanhece vez ou outra ao anoitecer
Os seios das mulheres enaltecem-se ao caminhar
O coaxar dos sapos desafia toureiros
As inexplicações dos sábios são incompreensíveis
Aos passos das seriemas.
Para todas as desmedidas da natureza
Quero olhos de lê-las,
Transformar-me, eu mesmo, em metáfora
Ser mumificado em Poesia:
Secularizar-me-ei por isso.


sexta-feira, maio 07, 2010

RELEITURAS ROSEANAS 11




Sujeito irregular na paisagem
Não se enxergava desumanamente postado na praça
Vestido em trajes festivos
Rodeado pela patuléia trapejante
Ofuscando suas mortais feiúras.

Postulava emergências
Maniqueava palavras fugidias
Tentando fazer-se entender.
Massa ignara não compreendia
Pensamentos ambulantes
Somente costumeiramente invocados à repetição.

Desistiu: caminhou.
A turba incrédula
Viu-o desaparecer-se nos portais imaginários
Do fim da rua, no fim da cidade:
O estranho cidadão e seu vocabulário
Descabido no ambiente.


quarta-feira, maio 05, 2010

RELEITURAS ROSEANAS Nº 10



"Amor é vaga, indecisa palavra"
nunca sai da boca solenemente:
ou a ruminamos 
nos cantos dos lábios
vergonhosa e sofregamente,
ou a grunhimos 
com a língua batendo nos dentes
sonora e largamente.
Nenhuma das duas parece natural:
(nunca é natural)
como se fácil fosse
solfejar decididamente
a palavra sempre esperada
nos ouvidos languidamente.

"Amor é vaga, indecisa palavra"
 nas errâncias humanas
nas inquietudes de suas trajetórias
nas impropriedades de seus dizeres.


quinta-feira, abril 22, 2010

sexta-feira, abril 16, 2010

CURTA NÚMERO 06




Sem gripe porcina
Minha febre felina
é erótica sina.
Febre alta que me queima
Vem do calor do desejo
Do ser amoroso.


quarta-feira, abril 14, 2010

VALE A PENA VIVER Nº 07

Despir a mulher
como se fosse a primeira vez
tua e dela:
esse é um dos segredos
da manutenção do encanto
do amor e da vida.

Despi-la em sonhos
noites a fundo
nos silêncios das ausências.
Despi-la com os olhos
em seguida com as mãos
nos sigilos das presenças.
Tatuá-la com agulhas invisíveis
cobri-la de palavras doces
vesti-la com sorrisos e beijos
envolvê-la com tua própria pele.
Deuses, escambo mil vidas
por esses momentos mágicos
de convivência amor e prazer.

segunda-feira, abril 12, 2010

VALE A PENA VIVER Nº 06


Não sei tocar instrumento
não sei cantar
pouco conheço sobre música
apenas alguns cantores e cantoras:
escutei caetano no palácio
assisti zeca e maria rita na praça
felicitei o corpo no forró do tom
também em maria maria do bituca
dancei com elza no clube vermelho
derramei o cálice do chico na vitrola
afundei submarino amarelo 
no tanque psicodélico dos beatles.
Tudo isso ainda é pouco:
quero viver eterna e musicalmente
o tempo que me resta de luz e poeira.

segunda-feira, março 29, 2010

sexta-feira, março 12, 2010

VIVER E APRENDER, APRENDER É VIVER



Aprender, aprender, aprender


aprender sempre


por este curto instante


que é a vida inteira.

segunda-feira, março 08, 2010

VALE A PENA VIVER 05



Duas cidades duas amantes
Rio tem mata mar montanha
Paris tem sena históra mistério
Qual delas mais bela?
Resposta perdida na atmosfera:
Quem sabe?
Caminhar por suas ruas
Zapear sem destino em seus prédios
Saborear suas arquiteturas
Aumenta mais ainda busca.
Rio é melhor lugar para comer
por seus bares e butecos
Paris é melhor para beber
pelas variedades etílicas.
Rio tem mais música
Paris mais introspecção
Duas cidades duas amantes
Preciso de outra vida
Para conhecê-las melhor.



sexta-feira, fevereiro 19, 2010

OBJETIVO IMPORTANTE

Diminuir meu índice de refração:
- tornar-me invisível para o sistema
(quase já não sou visto dentro d'água,
perco-me na vegetação de meu jardim).
Camaleônico - dirão alguns -
apenas ligeiramente fluido - reafirmo.
Não escorro entre os dedos de minha amada.

domingo, fevereiro 14, 2010

VALE A PENA VIVER Nº 04 - Concerto para Cecéu




Ano: 1998 eu creio
Local: Paris, Parque de Exposições da Porta de Versalhes
Motivo: Bienal do Livro de Paris
País homenageado: Brasil
Presença de muitos escritores brasileiros
Não os citarei para não provocar ciúmes nos esquecidos
Apenas a presente no episódio dessa narrativa:
Lígia Fagundes Teles palestrava
Em língua francesa
Pedia ajuda a uma intérprete ocasionalmente
A platéia se distribuía em pequenas mesas
Dispostas frente ao palco
Eu e minha companheira em uma delas
Bem localizada próxima à entrada.
Eis que entra Catherine Deneuve
Se acomoda em mesa vizinha:
A musa a menos de um metro.
Congelei a respiração
Para não perturbar a deusa.
Um olho em Lígia outro em Catherine
Uma orelha escutava Lígia, a sábia
Outra ouvia a respiração de Catherine
As duas narinas cheiravam Catherine
A boca aberta por Catherine
O queixo caído por Catherine
O coração batendo forte por Catherine.
Por largos quarenta minutos
Eu vivi Lígia e Catherine
Instante marcante em minha vida
Vale, provavelmente,
Uma década de minha existência.



domingo, janeiro 31, 2010

VALE A PENA VIVER Nº 03

 

O destino nem é tão longe
mas trajetória é árdua e sinuosa.
Dez quilômetros estreitos de estrada
negociação com o dono da fazenda
quarenta minutos de caminhada
por trilhas serpenteadas (sem/com metáforas)
algumas graviolas maduras para compensar:
assim são os caminhos dos cerrados.

De repente, num alçapão das montanhas
no fundo de uma grota perdida
descortinam-se a cachoeira e o pequeno lago.
Ao lado da queda d’água
uma montanha escalável
 - Como será no alto? –
Para subir a montanha
nas pontas dos dedos das mãos e dos pés
necessário atravessar o lago a braçadas.

Surpresa!
No alto da montanha outro lago (menor)
e outra cachoeira (tão bela quanto)
invisíveis a quem não se aventura
a vencer pequenas dificuldades escarpadas.
Mas a visão do vale
ao pôr-do-sol que se apresentava
valeu alguns anos de minha existência.



sexta-feira, janeiro 29, 2010

VALE A PENA VIVER Nº 02






A estrada é larga e longa
leva a destinos precisos
ou imaginários
ou a qualquer lugar não se sabe onde:
destinos não são importantes.

É noite.
Pessoas queridas dormem ao lado
ou no banco de trás.
Uma música leve
e guloseimas para mastigar
ajudam a espantar o sono.

Poucos faróis
tempo para pensare
e uma calma d’alma
como se cumprida uma promessa a si mesmo.
Esse estado de espírito
na auto-estrada à noite
vale uma vida.