segunda-feira, julho 23, 2007

RELEITURAS ROSEANAS 01


Sou feliz quando me descuido
de mim mesmo.

A gente se descobre nessas horas
fugidias
descompromissadas
descuidadas
em que os ponteiros se descolam dos relógios
e as clepsidras se inundam.

Quando o bom da gente
aflora sem querer
pois o ruim
está presente em todos os momentos.



sábado, junho 09, 2007

TEMPO REAL


Tempo real
é o tempo que desaparece.
Se o tempo desanuvia no espaço
o que resta?
O espaço?

Se a velocidade do tempo
suprime o espaço
a velocidade também
entra em extinção simbólica?

nem fim da história
nem fim da geografia,
tempo e espaço
almas gêmeas das territorialidades
sobrevivem em complexa simbiose,
em territórios ontológicos
ou reorganizados.

Tecnologias trazem
desterritorialização
das tribos sobreviventes:
as tribos sempre sobrevivem
em novos territórios
materializados à fórceps.


Catarses e emblemas



Campos sem girassóis não alimentam pássaros
amazonas desmatada ostenta deserto de ossos
horizontes negros de fumaça
de plásticos queimados
amortecem odores de dioxinas
Biocombustíveis dos paradoxos tecnológicos
mamonas assassinas dos campos e cerrados
movimentam vida de centros urbanos.

Mulheres pobres dos aglomerados

alimentam os filhos com balas carameladas
e batatas fritas de sacos plásticos coloridos.
Desnutrição embelezada
abastece dores de dentes cariados.

Alguns poemas são prévias de suicídios
catárticos e emblemáticos
evitam a dor (ou a antecipam)
da morte premeditada:
Ninguém morre só de palavras.
A boca e o sorriso da morena
passeando em minhas texturas
acalentam minha sanidade.
Escrevo poemas cáusticos
para sacolejar minhas alegrias.

Um dia aprendo a cantar uma música
e minha voz grave entorpecerá o ambiente.


terça-feira, junho 05, 2007

BRINCADEIRA DE DEUS ARTISTA

Esculpi uma boca na porcelana
dos pensamentos cotidianos
com cinzel e martelo
da oficina de projetos a serem patenteados.
Queimei-a no forno
das cerâmicas de altas temperaturas.
Sobre a peça reluzente
e ainda quente
pintei um sorriso deslumbrante
da cor de baton
entre o vermelho das paixões
e o claro dos amores serenos.
Deslumbrado com a beleza
da peça esculpida
como um miguel
anjo de tempos pós-modernos
disse - viva - e a beijei.
Surgiu uma linda morena
compondo a boca esculpida.
Brinco de deus artista
mas não fabrico mulheres em série.
Só as que convido para o amor.



quarta-feira, maio 23, 2007

BELEZA DAS PAIXÕES



Se eu acreditasse em deuses
Cristãos, muçulmanos ou umbandistas
E estivesse à beira da morte
Atropelado nas margens de uma estrada
Caminhos dos belos horizontes
E me fossem concedidos dez segundos
Para agradecer ao mundo pela minha existência
E convencer que teria sido boa gente
Que teria eu dito?
Teria eu louvado pelas mulheres
Agradecido por sua criação
Demonstração de inteligência e arte
Penitência divina pelas mazelas do mundo,
E dos homens principalmente.
Naquelas formas suaves
No traçado alongado de suas costas
Nas curvas arredondadas de ancas e seios
Na capacidade de doação e abandono
E, principalmente, no sorriso,
Sobrevivem a beleza das paixões.
Agradeceria por tê-las colocado na minha vida
Selecionado aquelas especiais
Para companheiras, amigas, amantes,
Alunas – denunciei-me
Passageiras de passos
Sem falar nos cachos dos cabelos.
Omitiria nesses dez segundos, eu sei,
Que se eu vier a renascer mulher
Lésbica eu serei.

segunda-feira, maio 21, 2007

SOL, SOU EU EM MAIO


Em maio eu não tenho medo de nada:
nem da solidão
nem da secura da garganta
nem de líquidos sobreviventes
que poderiam me afogar no largo da banheira
nem da ausência das mulheres em minha vida.
Em maio eu me caso comigo mesmo.
Não me basto, evidentemente: sou homem coletivo e plural.
Gasto-me em gestos
em dança
em caminhadas no seco sol da manhã.
Em despistagens das possíveis tristezas ambulantes:
Deixo que passem sem pouso em minha garagem.

O lado vazio de minha cama
Reclama
Não durmo de pijama e sinto frio.
Aponto apenas um fio
Para as águas do pequeno rio
Que deságua em minhas loucuras.
Sol, sou eu em maio.
Maio, sou eu ao sol.



HORTÊNCIAS SOB CHUVA ARTIFICIAL


As gotas são artificiais: chuvas que provoquei ao amanhecer. A luz do sol é natural. Já marcavam umas oito horas no relógio dos dias de quase inverno. Ah, eu sabia! ainda é outono. O que não quer dizer muita coisa nesta cidade das montanhas. Não temos inverno. O calendário de apenas três estações, fazendo diferença com boa parte do mundo, civilizado ou não (existe realmente uma diferença grande entre mundos civilizados e não civilizados?) não nos deixa nem um pouco diminuídos. A ausência de inverno nos presenteia com uma primavera mais longa. Com flores ao longo dos anos. Este pé de hortências me presenteia flores lilases esvaecendo aos poucos por longos períodos. Além disso, o sol de metade do ano me abastece com belos pôr-de-sóis, lindos amanheceres, noites estreladas, um pouco de fumaça no horizonte (isso por conta de estúpidas queimas de vegetação e lixo). E as chuvas da outra metade do ano garante a umidade necessária aos pobres solos tropicais. Quero olhos de ver coisas tão belas e sensibilidade para percebê-las, e fotografá-las.